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BORDADO POLÍTICO

Por Estefania Lima - entrevista publicada na Revista Urdume #01 [fev/2019]



Imagem: divulgação Clube do Bordado

O clube do Bordado é ator importante de um movimento de valorização das práticas manuais no Brasil. Com a ajuda de plataformas virtuais, as meninas que começaram sua trajetória com uma coleção de bordados Soft Porn seguem quebrando paradigmas sobre a prática no país.

Juntas desde 2013, Amanda Zacarkim, Camila Gomes Lopes, Laís Souza, Marina Dini,

Renata Dania e Vanessa Israel são conhecidas por usarem as redes sociais para compartilhar

conhecimento, experiências e promover a cultura do feito à mão pela internet.


No YouTube, são responsáveis por um canal que aborda desde pontos de bordado a empreendedorismo e empoderamento feminino. Para dar sustentabilidade à produção dos vídeos, em 2018, o Clube passou a oferecer um plano de assinatura mensal. Com uma contribuição de R$ 17 por mês, as bordetes, como são conhecidas as assinantes do plano, garantem um pacote de conteúdo digital, além de participarem em uma comunidade online de bordadeiras.



URDUME. Renata, o bordado é uma prática historicamente associada ao feminino e ao lar e o Clube do Bordado é um dos responsáveis por estar transformando essa realidade no país. Como vocês enxergam esse movimento e como a internet contribui para sua expansão?

Renata. Fazemos parte de uma geração que tem liberdade de escolha sobre suas atividades. Os trabalhos manuais, assim como os domésticos, têm um histórico de desvalorização pela sociedade. Isso se intensificou na década de 60, quando as mulheres sentiram necessidade de se distanciar dessas atividades para terem reconhecimento no mercado de trabalho. Hoje em dia isso mudou. Não é mais uma imposição que aprendamos isso ou aquilo para ser mulher “prendada” e, a partir do momento que as artes manuais passam a ser uma opção, elas perdem o peso da obrigação e dos rótulos. Essa ressignificação dos trabalhos manuais é um processo natural, mas que fomentamos e incentivamos através das nossas redes sociais. Além disso, nos esforçamos para a conscientização da comunidade sobre o valor dos trabalhos manuais, enquanto patrimônio cultural e preço justo.



URDUME. Há alguns anos vocês disponibilizam uma série de vídeos no YouTube que possibilitam que pessoas em qualquer lugar do país (ou mesmo do mundo) aprendam a bordar. Em 2018, vocês passaram a fazer isso também através de um plano de assinatura mensal. Como funciona esse modelo e quais foram os frutos dessa nova iniciativa?

Renata. Em fevereiro de 2018, lançamos este novo produto, que é o nosso plano de assinaturas. Nele o assinante contribui com o valor de R$ 17 mensais e recebe um pacote de conteúdo digital em seu email, com instruções técnicas de como fazer um bordado temático, mais uma folha com ilustrações extras relacionadas ao mesmo tema e uma live no nosso YouTube, tirando dúvidas de execução. O Clube do Bordado sempre se destacou pelas ilustrações e cartelas de cores que cria. Vimos neste reconhecimento a oportunidade de fornecer este serviço para pessoas que gostam de bordar, mas não necessariamente querem criar um desenho próprio. Estes bordados

são de uso livre, então permite que artesãs revendam estes produtos, gerando renda. As assinantes participam de um grupo fechado no Facebook que é a coisa mais linda; com troca de conhecimento, todo mundo se ajudando e crescendo junto. A ideia inicial deste plano era gerar uma renda fixa para nossa empresa, já que é muito difícil conseguir retorno financeiro através do YouTube, com o qual despendemos muitas horas mensais para disponibilizar conteúdo educacional gratuito. É um lindo ciclo de abundância que favorece todos os envolvidos.



URDUME. Os vídeos do Clube impulsionam muitas mulheres a transformações. Como isso é percebido e sentido por vocês?

Amanda. Ao longo desses anos, percebemos que esse movimento de aprender e resgatar as técnicas manuais está acontecendo numa esfera ampla, sem muitas barreiras de gênero, conhecimento prévio e independente de outras responsabilidades. Nós somos o interlocutor, mas

o agente é o público que, através de um desejo de equilibrar melhor a vida entre os excessos do dia a dia - trabalho, informação, telas, coisas prontas, industrializadas -, ressignifica suas atividades e rotina... E esse gatilho para começar algum trabalho artesanal pode aparecer de diversas formas, seja pela curiosidade de aprender algo novo ou para relembrar algo que era comum na infância e que ficou no passado, por exemplo. O legal é que a partir disso surge

um pequeno universo novo em que podem ser criadas novas conexões: um novo grupo de amigas (os), o desafio de testar materiais e técnicas novas, um jeito de lidar com inseguranças, ou um momento de bem-estar consigo mesmo. Pois, enquanto as mãos trabalham, é possível deixar o pensamento correr solto e aprender sobre o tempo que as coisas levam para serem feitas. Com tudo isso, acredito que essas transformações estão ligadas à expressão pessoal que essas técnicas favorecem. Num mundo em que tudo está "pronto", fazer algo com as próprias mãos é uma forma de colocar um pouco da nossa personalidade nas coisas e de satisfação acessível a todos nós. São muitos relatos incríveis que recebemos diariamente e compilamos algumas dessas histórias no perfil @gentequeborda, no Instagram.



URDUME. O Clube não deixa de se posicionar sobre aquilo que acredita e isso faz muita diferença. Mais do que um coletivo que ensina bordado, vocês são mulheres que usam a técnica como forma de empoderamento feminino, esclarecimento sobre questões sociais e direitos humanos. Como isso se dá para vocês? O quanto isso influencia na receptividade do público?

Renata. Nós consideramos como parte da imagem do Clube do Bordado compartilharmos nossos ideais através de nossas redes. E todos esses assuntos nos representam e moldam nossa forma de agir e trabalhar. É importante se posicionar, ainda mais nos tempos que temos vivido aqui no Brasil. Os posts que fazemos sobre assuntos como feminismo e política são os mais movimentados nos comentários. Tem sempre uma parcela do público que é de novos seguidores e ainda não estão familiarizados com nossa postura. Por isso, muitas vezes surgem comentários que discordam e criticam o fato de nos posicionarmos. Mas o resultado da balança é sempre positivo, na nossa opinião.



URDUME. Vocês são seis mulheres. É muita gente e isso também é algo muito inspirador na trajetória de vocês. O quão complexo e frutífero é equalizar todas essas relações?

Renata. O fato do Clube do Bordado ser formado por seis sócias é um grande desafio. A proposta da nossa empresa é de ter uma gestão horizontal, com poder descentralizado, em que as decisões e responsabilidades são divididas igualmente entre nós. Este formato de empresa nos força e nos possibilita exercitar diariamente nossa paciência, compreensão e proatividade. O respeito com que nos tratamos é algo que sempre me orgulha. Deveria ser um requisito básico para todas as relações, mas já trabalhei em outras empresas e sei que a prática não é bem assim, infelizmente. Tem sido um grande crescimento e uma experiência profissional incrível ao longo da nossa trajetória.

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